terça-feira, 27 de novembro de 2018

O melhor beijo

O MELHOR BEIJO

Jota Nil 
(Tácito Silveira da Mota)

Certa vez...
cobicei um botão de flor,
de rosa, já se vê,
que se entreabria lindo e perfumado,
oferecido à minha tentação...
Colhi-o.
E sob minha adoração
egoísta ele ficou até murchar!

É por esse motivo
que não posso mais te beijar...
Eu lembro do botão de flor
que murchou, tristemente, em minha mão...

E, nos beijos de amor,
querida, quase sempre
o melhor beijo...
é o que ficou em tentação...

segunda-feira, 26 de novembro de 2018

Ingenuidade

INGENUIDADE

Jota Nil
(Tácito Silveira da Mota)

Você diz coisas perigosas
com tanta ingenuidade,
a graça,
que, ditas por você,
se tornam deliciosas.

Você ja reparou, alguma noite,
na mariposa entontecida,
voluteando teimosa
uma luz, uma chama?
Ela é como você...

No seu encantamento, um dia,
cega, sem ver e sem pensar,
na loucura da luz,
numa doida alegria
ela irá se queimar...

Tuas mãos

TUAS MÃOS

Jota Nil
(Tácito Silveira da Mota)

As tuas mãos são duas rosas brancas
enxertadas!
Porque suas pontas
são deliciosamente rosadas...

No jardim, ao colher as rosas brancas,
enxertadas,
lembro-me de ti, querida,
e das tuas mãozinhas perfumadas.

Véspera

VÉSPERA

Jota Nil
(Tácito Silveira da Mota)

Eu prometi voltar!
Trocamos juramentos de fidelidade
mútua. Você me fez jurar
que por nossa felicidade
eu voltaria...
e eu prometi voltar.
Beijamo-nos;
eu beijava-a, mas refletia:
você beijava-me confiante,
- sem saber que eu mentia...

Partida

PARTIDA

Jota Nil
(Tácito Silveira da Mota)

Você me acompanhou até a estação.
Não trocamos palavras em todo o caminho,
e quando o silvo forte da locomotiva
anunciou a partida,
você tomou-me as mãos com carinho,
olhou-me apenas... e uma lágrima emotiva
deslizou...

O trem se pôs em movimento,
ganhou velocidade e,
sem um constrangimento,
para sempre nos separou...

Morte

MORTE

Jota Nil
(Tácito Silveira da Mota)

Cabelos brancos, algodoal
batido pelo vento; brancos lenços
agitados por mãos convulsas!
Olhos ansiosos que perscrutam...
nervos esfrangalhados, tensos, duros,
lábios cerrados para o mundo!

Algo rompeu o liame frágil d'alma
à carne exausta, quase morta.

Como o sol brilha sobre o charco,
a alma luz sobre o moribundo!


Tatuí, dezembro de 1955

Ode à Morte

ODE À MORTE

Jota Nil
(Tácito Silveira da Mota)

A angústia do vazio
no espaço ermo do Além.
Onde estão as estrelas?
O sol! Eu sinto um frio
estranho, imaterial!

Nada ouço, nada vejo...
No entretanto, Eu existo.
Sinto-o apenas, talvez
pelo medo... sim, medo
de ter perdido a Cristo!

Perscruto as trevas densas,
procurando uma luz!
Ausculto esse silêncio
total - pupilas tensas,
os ouvidos frustrados,
preso do desespero!

Grito. E ninguém responde!
E não ouço o meu grito.
Não encontro a mim mesmo.
Vejo-me só. E aflito,
procuro compreender.

Integro-me no Cosmos
universal, assim
como uma gota d'água
diluindo-se no oceano.
Luz que se apaga - é o fim!

Não alimentarei
mais ódio nem amor!
Meu orgulho ou vaidade
nada mais significam.
Não sentirei mais dor!

Oh! bem aventurança.
Eis-me liberto e forte:
não sou mais a unidade,
sou todo indivisível.
Bendita sois, oh! Morte!


Tatuí, Setembro de 1948

domingo, 25 de novembro de 2018

Diálogos íntimos (fantasia)

DIÁLOGOS ÍNTIMOS
(fantasia)

Jota Nil
(Tácito Silveira da Mota)

(O nosso banco, junto ao "belvedere",
estava vago. O sol banhava ainda
o jardim. Um perfume forte vinha
do próximo canteiro. Era jasmim...
Ela surgiu risonha como sempre,
e sem dizer palavra acomodou-se,
bem juntinha de mim, bem ao meu lado)

Eu:

Você está encantadora, meu amor!
Eu gosto imensamente desse seu vestido
branco, e do seu sorriso levemente irônico...
Hoje estou triste... E vejo em seu ar galhofeiro
que você zomba, ri desta minha tristeza...

Ela:

Antes de tudo, de mais nada, eu sou mulher,
e diante do elogio... rendo-me cativa
e feliz! E você, não se sente feliz
neste ambiente adorável, que nos incentiva
a admirar a vida, vendo a Natureza
que nos rodeia? Flores, o azul infinito,
um sol que se debruça sob um dossel doiro!
e bandos de andorinhas, estas borboletas
policromas, e aquele bando de crianças
a folgar, como em nossos corações, às vezes,
folgam tímidas, claras, doces esperanças...

Eu:

É romantismo seu. Não vejo o que descreve
com tanto ardor, paixão... Acho tudo banal,
insulso... corriqueiro; somente você
é uma deslumbrante exceção em tudo isto!

Ela:

Preciso construir minha felicidade...

Eu:
Sua felicidade é, pois, artificial!

Ela:

Não importa; o essencial é ser feliz na Vida...

Eu:

Bem sei. Quisera ter, como você, querida,
esse seu otimismo, essa mentalidade...

Ela:

Na procura do Belo, e fugindo às misérias
do mundo, encontrará dona Felicidade
um dia... - Mas talvez, por isso, me ache egoísta...

Eu:

Não! Uma mulher que, como você, na conquista
de um bem que não existe... Porque, se esquecendo
o lado mau da vida, necessariamente,
a face boa deixa de nos encantar
em breve; e você, ao se intimidar, sofreria...

(Emudecemos. E tudo dormita
no jardim. Um perfume forte vem
do próximo canteiro. É de jasmim...
No céu refulgem álgidas estrelas:
fez-se noite! bafeja-nos a brisa
quente da primavera; há arrepios
de amor em nossas bocas... Esmagamos
nossos lábios, sedentos, num sensual
beijo de amor: o lado bom da Vida...)

sábado, 24 de novembro de 2018

O Espelho e a Rosa (fantasia)

O ESPELHO E A ROSA
(fantasia)

Jota Nil
(Tácito Silveira da Mota)

Uma rosa pendia de heráldico vaso,
defronte de vestuto espelho emoldurado
em madeira de lei.
Pela janela entrava a brisa matutina,
acariciando a flor...
(a rosa falou)

Espelho amigo, escuta-me, é só por momentos,
pois que a minha existência... ela está terminada.
Eu não receio a morte e nem os sofrimentos,
mas... não quero morrer sozinha... abandonada,
sem um consolo amigo, sem um confidente
a quem possa contar a minha desventura...
(o espelho consolou-a)

Sou todo ouvidos, minha amiguinha, querida!
Também tenho uma história amarga a te contar...
(a rosa continuou)

Lá fora, no jardim, eu vivia feliz
entre as minhas irmãs... E quando no ocidente
o sol se recolhia, bem de tardezinha,
vinham os colibris contentes nos beijar...
À noite, a festa, então, todas as estrelas, todas
na abóbada infinita a brilhar... a brilhar!
A brilhar!... No canteiro oposto, um cravo branco
o vermelho mirava-me com tanto ardor
e paixão... (a flor cora da sua lembrança)
que cheguei, meu Deus!, a lhe ter um certo amor...
(a rosa pende mais no vaso)

Quando pela manhã, nos primeiros acordes
festivos, as primeiras borboletas vinham,
tontas de luz, de sol, de vida, nos saudar...
eu olhava o canteiro do cravo vermelho
e branco... Ele sorria, a me olhar... a me olhar...
(a rosa soluça baixinho)

Um dia... brutalmente, fui por alva mão
de mulher transportada para este quarto escuro,
onde só brilha a luz do teu bom coração!
(Há um pesado silêncio. A rosa se debruça mais)

Espelho amigo, fale você... Sou ouvidos...
(O espelho mirou-a pesarosa. Falou, a voz tremente de emoção)

Há muitos anos vivo neste quarto escuro...
só, sozinho! Vê minha desventura, amiga:
nunca brinquei com raios de sol nas manhãs
claras de primavera! nem das borboletas,
dos colibris eu vi o voo encantado,
nada! Vê, minha desventura é bem maior
que a tua! sempre fui infeliz, desgraçado!...
(a rosa agoniza, debruçada...)

Mas, a maior tortura, a pior das dores
que me fere continuamente... é por amar
como insensato a todas, sim, todas as flores...
(sobre o mármore cai a última pétala da rosa desventurada...)

Um galho seco pende agora, desolado,
do vaso entristecido...
Porém, a mão veludo de mulher, repõe
uma rosa-botão em o heráldico vaso,
defronte do vestuto espelho emoldurado
em madeira de lei!
Pela janela, invade a brisa vespertina,
acariciando a flor!  

quarta-feira, 21 de novembro de 2018

Saudade

SAUDADE

Jota Nil
(Tácito Silveira da Mota)

Há na aragem que passa docemente,
espiritual e feita de leveza,
algo longínquo que traz, lentamente,
ao nosso coração sutil tristeza...

Há na réstea de um sol incandescente,
a visão de um momento de beleza,
já passado, num tempo diferente...
Há neste poema lindo, de inquieteza,

algo nevoente, incerto, inexplicável...
É desses sentimentos subjetivos
que nasceu o vocábulo adorável,

a palavra do nosso coração,
dos nossos sentimentos afetivos:
é saudade, - a sublime inquietação! 

terça-feira, 20 de novembro de 2018

A árvore que eu plantei

A ÁRVORE QUE EU PLANTEI

Jota Nil
(Tácito Silveira da Mota)

Numa tarde, depois que o sol morreu
nas montanhas distantes do horizonte,
e a terra recolhida recebeu
da noite um beijo morno em sua fronte,
eu tomei da semente e sepultei-a!
Os dias se passaram... e daquela
semente pequenina, hoje se alteia
heráldica árvore, orgulhosa e bela!
Pelas manhãs, e pelas tardezinhas,
eu me recolho na contemplação
da árvore que eu plantei!... estão pertinhas
do céu as suas últimas ramagens...
Há no meu pensamento em ascensão,
também, as suas últimas imagens!

Relatividade

 RELATIVIDADE JOTA NIL (Tácito Silveira da Mota) Eu tenho os meus olhos para admirar as estrelas, para olhar a lua, para olhar as flores, pa...